Bocudo nasceu no colchão onde vive desde então. E é muito feliz ali, já que tem um amigo macaco só seu. Ainda que não tenha uma perna, não fale e nem saia do lugar, Macaco é quem ajuda Bocudo nas tarefas de fazer o tempo, a música e a dança estarem sempre indo.
No colchão a música e a dança nunca acabam, e mesmo com as facas que tem espalhadas por todo lado, o corpo de Bocudo dança muito bem. Aliás ele só se lembra delas, das facas, quando a dança fica mais fora de controle, culpa das músicas mais agitadas que vem de algum lugar que ele não sabe onde.
Na verdade ele gosta delas (das facas) e fica o tempo todo esperando por um novo acontecimento especial em sua vida, quando com certeza ganha uma nova faca ou uma nova boca, que brota delicada e decididamente de dentro pra fora. É o jeitinho dele pra registrar as coisas.
As bocas aparecem com mais freqüência que as facas, na verdade. São tantas que ele já perdeu a conta e nem lembra onde estão todas. As vezes, inclusive, muitas delas ficam falando ao mesmo tempo. Nessas horas Bocudo se concentra mais na música, na dança e no macaco, senão fica muito confuso.
Ele lembra bem dos momentos em que cada uma das facas apareceu, menos de quando e como brotou a grande que fica no peito. Dessa só lembra dos dias em que ela dói. Sempre se perguntou o motivo da dor, pois a ponta das suas facas está sempre pra fora do corpo. O que um cabo tem pra fazer doer? Por causa dessa dorzinha essa era a única faca que Bocudo não usava para cortar suas bananas.
Mas um dia uma garota muito simpática passou por perto do colchão de Bocudo e ele entendeu melhor a faca de seu peito. A garota simpática, que cuspia facas com lâminas para os dois lados, passou por ele, sorriu, dançou um pouquinho e foi embora.
Nesse mesmo dia o rapaz, que ficou muito eufórico e curioso, tentou abraçar seu amigo Macaco e acabou prendendo ele em uma de suas facas. Os dois decidiram ficar assim mesmo, grudados. Pelo menos agora Macaco também se mexia pelo colchão.
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